sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Artigo: Quem faz parte do Coral? Tem bilhete!




UNIVERSIDADE FEEVALE

PÓS GRADUAÇÃO EM MÚSICA, ENSINO E EXPRESSÃO

DISCIPLINA: PRÁTICAS MÚSICO-VOCAL

ARTIGO

Quem é do Coral? Tem bilhete!

PROFESSORA: AGNES SCHMELING
ALUNA: LÍGIA RAMOS

Novo Hamburgo, Novembro de 2011.


Um coro é uma espécie de tribo, com personagens essenciais, tais como os cantores e o regente; rituais típicos, tais como ensaios e apresentações; e objetos cultuais imprescindíveis, tais como a música e a partitura, sua representante material. Há, ainda, o público para o qual se canta, os representantes das eventuais sociedades ou empresas mantenedoras, as gravações realizadas, o professor de técnica vocal, etc.

(FIGUEIREDO, 2010, p.3)


Quem faz parte do Coral? Tem bilhete!

Resumo: O presente artigo destina-se à refletir sobre a prática do canto coral nas escolas, as dificuldades enfrentadas para sensibilizar crianças e jovens para esta modalidade musical nos tempos atuais, que metodologias podem utilizadas para tornar esta aprendizagem mais significativa, e apresenta, ao final, uma atividade que desenvolve os parâmetros musicais com as crianças com ludicidade e criatividade.

Palavras chave: canto coral, parâmetros musicais, ludicidade, criatividade.


A porta da sala de aula se abre e alguém pergunta: Quem é do Coral? Tem bilhete!
Seis alunos levantam-se pegam o bilhete e um exclama em voz alta: Nossa! Tem ensaio amanhã e apresentação de Natal na sexta-feira lá em Porto Alegre, no Hotel Plaza São Rafael!
A professora de Geografia torce o nariz porque sexta-feira tem prova e o aluno do Coral terá direito a fazê-la em outra data, o que vai ser um transtorno. Um grupo de colegas deixa escapar: Hum! Que chique! Outro colega resmunga no canto: Nesse calorão!!! O aluno do Coral aperta feliz o bilhete na mão. Nunca entrou no Plaza! Vai ser a primeira vez.


Existe o entendimento que a linguagem musical é inerente à vida humana, e que nos primeiros meses e anos de vida a criança mistura a voz falada com a voz cantada, tendo em vista os inúmeros estímulos musicais que lhe são apresentados. É sabido que o homem primitivo não falava. Essa característica da raça humana foi se desenvolvendo ao longo dos tempos, podendo ser aprendida em pessoas fisiologicamente normais, porém, precisa e pode ser aperfeiçoada, cuidada, protegida.
Considero a voz é o mais belo e perfeito instrumento musical que existe. Ela é um traço único de cada pessoa, uma manifestação da sua essência, suas impressões, sentimentos, traços culturais e familiares, enfim uma impressão digital sonora. Partindo destas premissas, pode-se afirmar que, de uma forma rudimentar, todos podemos cantar, e mais, todos temos todas as capacidades para aprender a cantar corretamente: é uma linguagem que precisa ser aprendida, assim como falar, andar, nadar. Mas é preciso treino, dedicação e técnica. Cantar é falar ao mundo de forma melodiosa, imprimir música nas palavras. É uma possibilidade de aproximação entre as pessoas, de extravasar sentimentos.
Quando executado em grupo, cantar reforça o pertencimento social, relações, possibilita conhecer novas culturas, pessoas e lugares.
A prática do canto coral, muito difundida nas escolas do país no período de Vargas, através do Canto Orfeônico, de Heitor Villa Lobos foi, aos poucos, perdendo espaço nas escolas com a implementação das legislações educacionais que conduziram para a aplicação das artes plásticas, mantendo-se me poucas iniciativas na redes públicas de educação.
Ainda que a Lei Nacional de Diretrizes e Bases da Educação Nacional aponte para o estudo das quatro modalidades artísticas: artes plásticas, música, teatro e a dança, a qualificação dos professores, a grande maioria, formado em artes plásticas, tem desenvolvido prioritariamente, conteúdos ligados a essa modalidade. Desta forma, a música e especificamente o canto, tem ocorrido forma tímida no contexto escolar.
A predisposição para participar ou não de um grupo de canto, pode estar ligada ao entendimento e à percepção que cada individuo tem da sua voz. Da mesma forma, a metodologia do professor em relação à percepção vocal pode incidir neste entendimento. A voz pode ser explorada de forma muito rica! Ela precisa ser compreendida como o instrumento mais perfeito, mais complexo e dinâmico. Quantos e quê diferentes sons a voz pode executar? Quais sãos as suas texturas, alturas, como pode ser expressada e explorada?
A voz pode ser considerada como a chave da porta que abre o universo sonoro, porque o canto oferece possibilidades de vivenciar os parâmetros musicais: altura, intensidade, ritmo, senso harmônico, andamento, contrastes; e a música encontra na voz a sua mais natural expressão!
Além disso, integrar um grupo de canto é uma experiência insubstituível, além de ser um benefício para o adolescente, pois amplia sua visão de mundo. Cantar em grupo reforça princípios de solidariedade, confiança, companheirismo, harmonia. O canto coral pode configurar-se como um veículo de expressão de descobertas, conflitos e anseios.
Mas, se a voz tem toda essa importância, se o canto traz todo este benefício, por que grande parte das crianças e, principalmente os adolescentes e jovens não se interessam pela prática do canto coral?!
Existe ainda em nossa sociedade, a idéia que o canto coral está intimamente ligado às manifestações religiosas ou cívicas; que o uniforme comumente utilizado é antiquado, que as peças executadas são antigas e não pertencem ao universo jovem.
As idéias de Keith Swanwich são bem claras neste sentido: a música é um discurso; o professor de música não pode ser um treinador ou instrutor, a aprendizagem musical precisa partir da ação e não do fragmento; é preciso considerar o discurso musical dos alunos; e que a fluência musical deve anteceder a leitura e a escrita musical, os processos de sensibilização musical se apresentam como a possibilidade mais concreta para conquistar as crianças, os adolescentes e os jovens para a prática do canto coral.
Inseridos em uma perspectiva sociointeracionista de aprendizagem, os processos coletivos de sensibilização musical devem levar os indivíduos a agir e compreender significativamente elementos sonoros/musicais, primeiramente de forma intuitiva, vivenciando os parâmetros sonoros, e somente mais tarde buscando a compreensão da notação musical tradicional.
O coral precisa ser um espaço que propicie a exploração da criatividade e a trocas práticas e reflexivas, pautadas pela socialização dos conhecimentos entre seus integrantes, ainda que estes tenham experiências diversas e em níveis diferentes em música. Neste contexto, o repertório a ser executado, deve, primordialmente, surgir da vontade e do desejo dos cantores, pois não diferente de outras aprendizagens, o conhecimento musical precisa ser rico em significados para ser abstraído.
De acordo com Sekeff (2007:54),
O fazer musical é sempre animado pela afetividade.
Partindo dessa premissa, o educador precisa compreender a importância do “querer”, do desejo de aprender da criança e do jovem, assim como colocar-se na incessante busca em despertar esse desejo em seu aluno.
Na realização da disciplina Práticas músico vocais do Curso de Pós Graduação em Música, Ensino e Expressão da Universidade FEEVALE, fomos instigados a trazer para a prática de sala de aula, com nossos colegas, atividades realizadas no cotidiano em educação musical. Escolhi uma atividade que envolve os parâmetros musicais, em especial, a altura e o ritmo, introduzindo as noções de Agudo e grave. É uma RAP que conheci na oficina da educadora Telma Chan, no II Encontro internacional de Educação de Gravataí.
Eis a letra:

Sou o som agudo da Olívia Palito! (pá - palma)
Sou o som grave, (tum - pé) muito mais bonito!
Bonito, não (pá - palma), diferente!
Tudo bem, (tum - pé) vamos em frente!
O som sobe! (pá - palma)
Desce, (tum - pé) o som desce!

A atividade é muito apreciada pelas crianças e jovens, porque, ao apresentá-la, utilizei um Power Point com a letra, e onde consta os “pás e tuns”, existe a figura de uma menina e um menino.
A realização desta atividade auxilia a criança na tomada de consciência de sua extensão vocal, a medida que a faz refletir sobre qual maneira de cantar lhe é mais confortável. Além disso, ao identificar elementos musicais com imagens do imaginário infantil, no caso o Popeye e sua namorada Olívia Palito, possibilita à criança incorporar conhecimentos musicais às suas construções prévias, desenvolvendo-se ainda mais.

Considerações finais:
A educação musical, e, em específico o canto coral, como em todas as aprendizagens, carece de significados para que seja interiorizada, amada, vivenciada com prazer. O educador musical deve ser um constante e entusiasta pesquisador, que conheça profundamente a criança e o jovem, e compreenda, de forma fraterna as evoluções que a cada geração se apresentam, e adapte seu conhecimento musical às necessidades de cada uma delas, respeitando-lhes as preferências, as construções individuais e coletivas, apresentando-lhes, de forma criativa e dinâmica o universo musical e cultural que lhe é de direito conhecer, mas nem sempre há motivação para fazê-lo.
Os benefícios que atividade musical do canto coral traz para os jovens e crianças é uma experiência que não pode ser subtraída do seu cotidiano, pela simples falta de desejo de conhecê-la, ou pelo preconceito em torno da ação do canto coletivo. Consiste em uma oportunidade única a ser valorizada por pais, educadores, por toda a sociedade.



Referências:

COSTA, Patrícia. Coro juvenil nas escolas: sonho ou possibilidade? Música na Educação Básica. Porto Alegre, v. 1, n.1, outubro de 2009.
FIGUEIREDO, Carlos Alberto Figueiredo. LAKSCHEVITZ, Elza. CAVALCANTI, Nestor de Hollanda. KEER, Samuel. Olhares sobre a música coral brasileira. FUNARTE, Ministérios da Educação, Brasília, 2003.
SCHIMITI, Lucy Maurício. Regendo um coro infantil...Reflexões e propostas práticas para o trabalho musical com crianças. Publicação Oficial da Associação Brasileira de Regentes de Coros. Ano II, n. 1, 2003.
SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e Cristina Tourinho – São Paulo: Moderna, 2003.
ZAMPRONHA, Maria Lúcia Sekeff. Da música, seus usos e recursos. São Paulo: UNESP, 2007.

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